sexta-feira, 31 de julho de 2009

Miragem

Subo até o monte mais alto da palavra.
De lá avisto um oceano cor de esmeralda de parágrafos por serem cerzidos, de frases saudosas umas das outras, de idéias que ainda não haviam se avizinhado, de luminescentes encontros de palavras desgarradas, de metáforas e mais metáforas a boiarem sonolentas sob o Sol...

segunda-feira, 20 de julho de 2009

"Fortaleza Revisited"

De Nova Lisboa pouco te resta. Conservas ainda o hálito marinho, uma pitada de verde ainda se exibe nas tuas sinuosidades, pouco da alarmada exuberância de outros tempos. A macia textura do vento ainda sabe te embalar, doce alívio no rescaldo das ruas e avenidas. Com viço e vitalidade, conservas ares de moça. Mas a tua memória é curta, o sol na cabeça talvez seja demais. Te falta respeito e reverência ao que já foste. Não tens remorso, olhas para um futuro com olhos de deslumbramento. Mas alguma coisa em ti ainda resiste. O mar é testemunha. Talvez teu nome ajude.

terça-feira, 14 de julho de 2009

"Guardar", Antonio Cícero.

Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la.
Em cofre não se guarda coisa alguma.
Em cofre perde-se a coisa à vista.
Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por
admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado.
Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por
ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por ela,
isto é, estar por ela ou ser por ela.
Por isso, melhor se guarda o vôo de um pássaro
Do que de um pássaro sem vôos.
Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica,
por isso se declara e declama um poema:
Para guardá-lo:
Para que ele, por sua vez, guarde o que guarda:
Guarde o que quer que guarda um poema:
Por isso o lance do poema:
Por guardar-se o que se quer guardar.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

O charme da solidão

"A solidão só vale a pena se tiver espectadores para a admirarem", frase que pincei de um livro do escritor português Miguel Sousa Tavares.

Penso que até a solidão tem seu conteúdo narcísico, que ela só é suportável e atraente se pode ser compartilhada, se possui um interlocutor. Todo escritor diz que escreve como companhia à solidão. Mas escreve também para ser lido, para que alguém usufrua de sua solidão. Escreve para ter uma solidão acompanhada, ainda que também para acompanhar-se ("Acompanha-se!" Antonio Porchia).

A solidão dos monastérios, dos presídios, dos claustros, despida de qualquer verniz estético, de quaisquer espectadores, de qualquer comunicação com o outro...talvez essas sim sejam as mais solitárias das solidões.